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quinta-feira, 3 de março de 2016

Voltando a Siegel; falando de renda fixa

Estimulado por um comentário que li em algum blog de finanças, revirei minhas prateleiras para encontrar o livro de Jeremy Siegel, Investindo em ações no longo prazo (Ed. Bookman, 5ª edição) e consultar uma informação. O livro é bem interessante, especialmente por expor diversos estudos diferentes acerca dos rendimentos de diferentes aplicações no longo prazo. Ao encontrá-lo e consultar a informação que procurava, revi novamente todos estes estudos e decidi escrever um artigo, visto que o momento é bem oportuno. Então, vamos lá.

Navegando pelos sites brasileiros que abordam investimentos e lendo a opinião de seus especialistas, podemos chegar a uma conclusão: é a hora da renda fixa. Com o tesouro pagando uma rentabilidade real de aproximadamente 7%, dificilmente vemos alguém defendendo que há investimento melhor a se fazer no momento do que os títulos públicos. Mas eu discordo: há sim; as ações historicamente superaram os títulos em rentabilidade no longo prazo, independente de quão alto estavam os juros, quão absurda estava a inflação, quão destruidoras foram as guerras, crises, e quaisquer outros eventos catastróficos do passado. E isto está evidenciado no livro de Jeremy Siegel.

O livro nos mostra dados interessantes comprovando que as ações são sim consideravelmente mais rentáveis no longo prazo. Através de um estudo com dados da economia americana abrangendo o período de 1802 até 2012, Siegel traçou um comparativo entre uma carteira diversificada de ações ordinárias escolhidas aleatoriamente e uma carteira composta de títulos públicos, sobre variados horizontes de investimento. Os resultados estão demonstrados abaixo:


Observem que para o prazo de um ou dois anos, as ações superam a rentabilidade dos títulos em cerca de três a cada cinco vezes, porém aumentando o horizonte de investimento, a rentabilidade das ações supera de forma progressiva e cada vez mais absoluta o rendimento dos títulos, ao ponto de que em um horizonte de trinta anos, em praticamente cem por cento dos períodos estudados as ações superaram os títulos públicos, assim como as letras do tesouro.

Abrindo um parêntese: quando penso no coro uníssono a favor de títulos vejo que vivemos em um país tão medíocre que a leitura de nossos jornais econômicos e de nossos especialistas financeiros nos prejudica muito mais do que ajuda no que diz respeito aos nossos próprios investimentos. Temos de passar por crises de confiança terríveis graças à enorme quantidade de desinformação que lemos diariamente. O investimento em valor é visto pelos analistas brasileiros como ineficaz, e constantemente somos recomendados a investir ou deixar de investir em empresas devido a situações exclusivamente momentâneas. O resultado disso? Dificilmente encontramos investidores no Brasil que mantêm suas aplicações por um período superior a dois anos. 

Infelizmente, a cultura afobada e a visão completamente distorcida que os brasileiros têm do mercado de ações faz com que, em geral, exista uma fortíssima corrente que os induz a se preocuparem demasiadamente com os retornos no curto prazo, o que acaba resultando em estratégias de investimento desastrosas, sem o menor embasamento racional e perspectiva de futuro, e que acabam gerando enormes perdas para a grande maioria dos investidores. Neste cenário, não é de todo ruim que se recomende títulos públicos... o investidor brasileiro comum não tem disciplina para manter uma carteira de ações, por isto, está fadado a perder dinheiro. Mas não, os títulos não são o melhor investimento.

Voltando ao Siegel, vejam outro exemplo claro de que as ações dão um banho de rentabilidade na renda fixa. No gráfico abaixo, foi simulado uma situação em que o investidor aplicasse um dólar em diferentes classes de ativos no ano de 1802 e mantivesse o capital aplicado durante dois séculos (óbvio, isso não é possível de forma prática, mas o gráfico tem o objetivo de apenas mostrar a evolução do capital). 




Pois é... o investidor que tivesse aplicado um único dólar em 1802, teria acumulado uma fortuna de 13,48 milhões de dólares no ano de 2012, enquanto o investidor que comprou títulos públicos teria acumulado cerca de 33,92 mil. O retorno real dos investimentos em ações no período estudado (já descontado da inflação) chegou a cerca de 8,1%, e importante salientar: não houve critérios de seleção para as ações que analisassem a administração das empresas, a sua consistência nos lucros, sua perspectiva de futuro, o estado de sua dívida, o crescimento de seu patrimônio... nada. Muitas das empresas que integraram esta carteira tiveram resultados pífios, mas mesmo assim podemos observar claramente que as ações predominaram sobre todas as outras classes de ativos. Será que os analistas brasileiros têm conhecimento destes dados? Por que então recomendam efusivamente o investimento em renda fixa?

“Ok, mas estes dados dizem respeito apenas aos Estados Unidos, que constituem a maior economia do mundo e cresceram assombrosamente nestes últimos dois séculos.”

Para a minha felicidade, a quinta edição do livro de Siegel já cuidou de refutar este argumento. Na verdade, Siegel foi bastante questionado após a publicação do primeiro volume, em 1994, sobre a validade de seus estudos para nível mundial. Movidos por esta questão, um grupo de economistas do Reino Unido examinou os retornos históricos das ações e títulos públicos em 19 países partindo do ano de 1900. A pesquisa foi publicada em 2002 em um livro intitulado Triumph of the Optimists: 101 years of global investiment returns. Resultado?


Pelos próprios autores:

“Em todos os países o desempenho das ações foi melhor do que o dos títulos. Ao longo dos 101 anos, apenas dois mercados de renda fixa e somente um mercado de letras ofereceram um retorno melhor do que o nosso mercado acionário no pior desempenho.”

Dizer o quê? Que o Brasil não está incluído nos países analisados? Mas como poderia estar, se somos completamente insignificantes perante ao mundo?

Toda a história corrobora a afirmação de que uma carteira diversificada de ações é o investimento que traz melhores retornos no longo prazo entre todas as outras classes de investimento disponíveis no mercado financeiro, não importa a situação econômica que o país possa atravessar. E mais: uma seleção de empresas feita com a devida diligência complementada de um acompanhamento constante da evolução de seus resultados pode trazer rentabilidades extraordinárias para o investidor que tenha paciência e disciplina para persistir em seus investimentos.

“Então você quer dizer que os títulos não estão bons para comprar?” Claro que estão, mas entre eles e uma carteira diversificada com boas empresas, não tenho dúvidas sobre qual escolher.

9 comentários:

  1. Enquanto não tiver o Brasil, mantenho algumas dúvidas.

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    1. CF,

      Suas dúvidas são legítimas. Mas existem estudos mostrando o mesmo comportamento para o Brasil. O livro "O mercado de ações em 25 episódios" é um ótimo exemplo, que me vem a cabeça agora.

      Abraços.

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  2. Olá PM!

    Excelente texto. Realmente não temos a cultura de investir em ações olhando para o longo prazo, aqui tudo é rentabilidade, por isto que a maioria perde na bolsa.

    Abraço

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  3. VDC,

    Exatamente! O investidor comum, ao ignorar o longo prazo, tem suas chances de sucesso reduzidas drasticamente. Fora que não seguir à risca a própria estratégia é o mesmo que não ter uma estratégia. É por essas e outras que a maioria dos investidores não têm sucesso.

    Abraços.

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    1. PM, tivemos uma aula em tempo real. Olha um exemplo: O cara que comprou BBAS3 em Dezembro de 2015 a R$ 18,00, quando BBAS3 chegou em R$ 13,00 entrou em pânico e vendeu. Foi aplicar em Renda Fixa.

      Aí o Mercado sobe de forma eufórica, BBAS3 menos de 3 meses depois, R$ 18,00 de novo ...

      É por isto que, depois de tanto quebrar a cabeça, vi que girar patrimônio é a maior bobagem mesmo ... Lógico, comprando empresas boas e dando tempo ao tempo.

      Para quem investe em BBAS3 para receber dividendos, nestes 3 meses, nada mudou.

      Abraço

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    2. Pois é, VDC. Girar patrimônio é perder patrimônio, não tem jeito. O Banco do Brasil de dezembro de 2015 é o mesmo Banco do Brasil de hoje. Não ocorreu nenhuma mudança significativa na administração do banco que justificasse uma mudança de posição de lá para cá. Se alguém analisou em dezembro ele como ruim, então continua ruim; se analisou como bom, então continua bom.

      O grande problema é que a maioria dos investidores se deixa influenciar por notícias e mudam seu humor e suas perspectivas de acordo com as oscilações do mercado. Isso é terrível, pois não permite que eles sigam uma estratégia racional de longo prazo, e acabam pautando suas decisões de acordo com seu otimismo, perdendo muito dinheiro com isso.

      Abraços.

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  4. PM,

    A única coisa que eu posso fazer é isso:

    CLAP, CLAP, CLAP!

    Não sei como eu não havia lido esse seu post antes, rs. Concordo 100% com ele e continuo absolutamente tranquilo com a minha carteira de ações.

    Abraços e parabéns!

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    1. Valeu, IL!

      Fico feliz que tenha gostado.

      E você está certo, tranquilidade é mais do que essencial para o sucesso no longo prazo.

      Abraços.

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  5. O estudo de mercado queo Siegel faz nessa parte do livro é fantástico. Fico estarrecido quando ouço um suposto especialista dizer que defende que só se deve investir em renda fixa para o longo prazo.

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